Gênero: Progressive Rock
1. Especulações Gravitacionais
2. Incandescente
3. Hanging Garden
4. Insolação
5. Singular
Bonus Track
6. Crimsoniana (Ao Vivo - Boto Rock Festival)
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O Rock Progressivo, vertente tão criativa e que ajudou a elevar o Rock ao patamar de uma Art-Rock superior, foi duramente vilipendiado ao final dos anos setenta por conta de uma ação torpe, arquitetada por marqueteiros que usaram tal escola como um autêntico bode expiatório para criar uma atmosfera favorável para que um tipo de arte menor, dominasse os espaços, despoticamente.
Portanto, tirante a propaganda antagonista que gerou esse paradigma errôneo e deveras injusto, a verdade é que tal vertente sublime (por conta da sua natureza tão bem amparada nas influências que teve para expressar-se), resistiu bravamente aos ataques sistemáticos, ainda que muito paulatinamente, a atuar em nichos minúsculos e praticamente invisíveis do grande público (e sobretudo de certos setores da mídia, que adotou a ideia de adorar odiá-la), atravessou os anos, 1980 e 1990, com dificuldades e já na primeira década do século XXI, demonstrou pequenos, mas firmes sinais de renascimento.
Que bom, temos uma geração jovem que nasceu sem saber que no passado, tal estilo fora tão execrado, de forma torpe e gratuita e assim, livre para pensar, o redescobriu, saiu à cata de informação para vir a conhecer os seus ótimos artífices do passado e sobretudo, nutriu vontade para formar bandas e entrar em estúdio para produzir o Rock Progressivo, aqui e agora.
Pois este é o caso de uma banda oriunda de Porto Velho, a capital do estado de Rondônia, chamada: Prognoise. Formada em 2012, por um grupo de amigos e entusiastas do Rock Progressivo clássico, da década de setenta, eis que mostraram talento e muita determinação em dar o seu recado, quando lançaram em 2015, o EP “Esquizóide”. Após algumas reformulações na sua formação, lançaram recentemente, em 2018, o CD “Solar”.
Trata-se de um trabalho feito com muita qualidade artística, a demonstrar claramente as ótimas influências do Rock Progressivo setentista e também ao acrescentar uma boa dose de MPB, a música erudita in natura (considere-se naturalmente que a música erudita é um dos pilares do Rock Progressivo clássico, assim como a Folk Music europeia de uma maneira geral), Jazz e o Neo-Progressivo mais contemporâneo.
Em “Solar”, o Prognoise mergulha sem temores nos longos temas fatiados em suítes, um elemento tradicional dentro dessa escola e assim, demonstra não importar-se com questões mercadológicas que empurram os artistas a compor e arranjar canções mediante parcos “três minutos” de duração, para seguir o paradigma radiofônico da música Pop. Que maravilha, esses artistas estão interessados em produzir arte e não artigos descartáveis para vender no varejo dos supermercados.
Banda formada por ótimos instrumentistas, que compõem e arranjam muito bem as suas canções, mediante execução vocal e instrumental em alto nível, como manda a cartilha do gênero e sobretudo, os seus componentes mostram inspiração em suas criações.
No quesito das letras, discorre-se sobre questões existenciais do Ser Humano, em via de regra, a demonstrar uma preocupação em abordar questões mais profundas da natureza humana, com uma boa dose de poesia.
Sobre a capa do CD Solar, assinada pela artista gráfica, Bárbara Ugalde, o simbolismo é imediato ao mostrar um bebê em gestação, ao sugerir que está a desenvolver-se em um ventre, que na verdade representa o sol. Tal imagem dá margem a várias interpretações, naturalmente, mas de uma maneira geral, faz menção à criação da vida e entenda-se tal conceito pelos aspectos micro e macro, portanto, é algo bastante amplo. Como diziam famosos Proggers setentistas brasileiros: “Tudo Foi Feito Pelo Sol”, e assim, faz todo o sentido que o Prognoise resgate tal conceito no mundo de 2019, e ao ir além, nestes tempos trevosos, precisamos mesmo da luz do sol de outrora.
A respeito do áudio, este mostra-se consistente, com um bom trabalho de estúdio. Muitos timbres dos instrumentos remetem às sonoridades tradicionais observadas por grandes ícones do Rock Progressivo dos anos setenta, entretanto, há também um certo conceito moderno em alguns aspectos, a estabelecer uma média como resultado final. Sobre as faixas, quase todas mostram-se longas para honrar as tradições desse gênero e com duas mais curtas, apenas, em seu bojo. Devo acrescentar mais algumas observações sobre as canções.
“Especulações”
Trata-se de uma canção amena, ricamente arranjada por uma camada de instrumentos (guitarras e teclados) a trabalhar com arpejos. Existe uma bela melodia solada por uma das guitarras, com o uso muito bonito do efeito do delay.
“Incandescente”
Esta música inicia-se com um belo Riff versado pelo Hard-Rock setentista, em duo pelas guitarras e com apoio do órgão Hammond a sustentar-se com um timbre grave, muito belo. Usa-se uma fórmula de compasso não usual neste instante (7/4), com bastante criatividade. Vem a seguir uma longa convenção com um solo estabelecido por um sintetizador a evocar o velho Mini Moog, muito bonito. Eis que sob uma desdobrada rítmica, vem a parte inicial cantada, com rica harmonia a sustentar tal base. Bonitos backings vocals enriquecem bastante a beleza dessa melodia e a cozinha (baixo e bateria), mostra-se bastante firme, gostei muito.
Advém uma parte adicional pesada, com ares mais modernos, mas a conter um solo feito pelos teclados, que simula o efeito de um theremim e isso produz um colorido psicodélico incrível à canção. Gostei muito do solo de guitarra, também.
Bruscamente apresenta-se uma nova parte e a conter mais um solo de guitarra. Desta feita com um balanço muito acentuado e a contar com o apoio do órgão Hammond, lembra muito o som de bandas como o Triumvirat, Trace, Omega, ou seja, só remete a exemplos edificantes, ao meu ver.
Eis que mais um trecho ocorre, desta vez com extrema doçura, a mostrar violões muito bem timbrados e tocados, além de uma insinuação ao Flute Organ. A voz flutua em meio a um ritmo agradável e pontuado por contra-solos produzidos pelo sintetizador, intercalados com guitarra. A música finaliza-se com mais uma longa convenção, com brilhantismo.
“Hanging Garden”
Esta canção inicia-se com uma harmonia bela, sob a delicadeza de uma arranjo bem engendrado, a dar vazão para que o som do violino expresse uma linda melodia introdutória. A letra, como sugere o título da canção, foi escrita em inglês. Lembrou-me pela sua singeleza, o trabalho do Genesis, em seus áureos tempos.
Um pouco adiante, o som esquenta, com uma mudança de ritmo e para tal, existe mais solos de violino e guitarra, ornados por um ótimo trabalho com piano. Baixo e bateria muito bons, gostei bastante da atuação de ambos. Eis que uma soturna parte chega abruptamente e lembra bastante o caráter sombrio do King Crimson. Efeitos muito bons são acrescentados, com muita criatividade, principalmente pelos teclados. O piano sobra com uma base de sintetizador ao fundo e a voz solo dá o seu recado. A banda volta a dar peso para o grande final, a valorizar a melodia cantada, com o violino a pontuar com riqueza tal trecho e assim a abrir o caminho para um lindo solo de guitarra, que revela-se épico, sob a ação de um efeito de "looping".
“Insolação”
Sob uma estrutura quebrada, em termos rítmicos, a canção inicia-se com tal ênfase muito interessante. Entra a parte cantada com peso e é possível até encarar tal trecho como algo mais palatável aos ouvidos não acostumados ao Prog Rock, com certa característica Pop. Mas que não engane-se o leitor, pois soar Pop não significa subtrair o nível e assim, tudo é bem tocado ao extremo.
Logo a suíte encaminha o ouvinte para outras sonoridades, pois uma convenção intrincada é cheia de colorido pelo arranjo e uma parte mais orientada pelo "Space-Rock" chega, mediante efeitos produzidos pelos teclados, tudo muito bonito e a garantir o direito à epifania de quem costuma mergulhar em digressões viajantes, sem nenhuma preocupação em saber quando isso acaba (e pelo contrário, a depender da situação, deseja-se mesmo é não voltar mais, se é que o leitor permite-me tal divagação).
Uma parte rica em balanço, traz uma melodia muito bonita e permite ao baixo estabelecer uma linha com notas dobradas, deveras rica, gostei muito e com essa desenvoltura, também oferta a oportunidade para o baterista soltar-se. Uma surpreendente etapa bem centrada no Blues-Rock, tem um peso contundente. A suíte desemboca na parte cantada mais uma vez e sob a repetição de uma elaborada convenção, encerra a obra. Bravo!
“Singular”
Bela e singela canção a trazer um arranjo com violões e viola, muito bem concatenados. Contém um elaborado trabalho melódico, inclusive enriquecido com a presença de uma cantora convidada, Mariana Gonçalves, a trazer o timbre feminino em contraste, o que sem dúvida, garantiu um élan para a canção. Há também um bom trabalho dos teclados, com efeitos estabelecidos ao sintetizador e um singelo mellotron que encerra o trabalho.
“Não tema, apenas se deixe levar / A vida é singular”, diz um trecho da letra e em suma, creio que a síntese seja essa mesmo, em torno de não haver amarras, e assim, que jamais deixemo-nos seguir os parâmetros estabelecidos por outrem. A vida é singular, e a grande viagem é para dentro de nós mesmos, perfeito.
Recomendo o trabalho do Prognoise, certamente, e torço para que esse ótimo grupo siga em frente, com uma longa carreira adiante.
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